O tempo é o senhor de todas as
coisas, mas cabe àqueles capazes de transformar o espaço em que vivem a grande
responsabilidade de servirem como guardiões da memória. Todos, indiferentes a
diversidade cultural existente, tem um grande compromisso consigo mesmo. Não
existe nada que possa provar que a nossa geração é melhor do que as que nos
antecederam.
Não se trata de nenhum modo
afirmar que tudo deva ser preservado, porque se tudo fosse preservado não
haveria lugar suficiente, nas casas ou nas propriedades. Em algum momento
seriamos sufocados pelo excesso das coisas em desuso. Sentiríamos como que se
vivêssemos num lugar esquecido no tempo. Trata-se efetivamente é de preservar
alguns exemplares, algumas formas arquitetônicas, alguns lugares de memória,
algumas relíquias. Bens móveis ou imóveis, bens que podem ser tocados ou que
tocam a gente por seu significado. Bens
que fazem parte de uma memória coletiva, precisavam de severa
avaliação.
Principalmente nas décadas de
1970 e 1980, foram sendo demolidas casas e casarões, queimados documentos e
fotografias, o que de alguma forma não representasse o poder do século XX,
provenientes de uma ideologia consumista e de abrangência mundial. Junto com
esta mudança ideológicas, foram-se muitos resquícios que ligavam as pessoas às
suas origens, que as faziam diferentes de outras existentes em outros lugares.
Por isso é importante preservar
alguns resquícios do passado. Porque todo o poder econômico gerado nesta terra
é fruto de muito trabalho, fé e determinação, aceitemos isso, ou não, isso faz
parte da nossa história. Foi um esforço contínuo, geração após geração, o que
deve ser motivo de orgulho e não de vergonha.
Preservar significa manter, conservar e dar significados, tornar
útil. Podemos exemplificar com a questão dos imóveis. Existem inúmeras formas
de manter características históricas e ao mesmo tempo usá-los de forma moderna
e inteligente. Existem lugares em nosso país, onde o próprio poder público
incentiva que se preserve ao menos as
fachadas, podendo construir por trás delas espaços modernos e arrojados.
Existem lugares, onde o poder público auxilia através da isenção parcial de
impostos às construções modernas, feitas com características arquitetônicas
específicas de uma época.
A preservação pode acontecer no
todo ou em partes, condizendo com as condições estruturais, quando bem
conservadas ou em estado de ruína. Sendo viável, e um imóvel de importância
comum, sem a menor dúvida, recomendasse o restauro. Não sendo viável,
recomendasse a conservação, a manutenção e a troca das partes danificadas ou
que apresentam perigo de perda total. Com toda a tecnologia que dispomos é
possível fazer as mais variadas formas nos mesmos moldes que as originais. É
possível trocar a fiação de luz, o encanamento, controlar as infiltrações,
trocar a cobertura ou forro, pintar. Sem com isso descaracterizar ou demolir um
lugar de memória. O que deve ser considerado não é o valor a ser investido, mas
o valor que um determinado imóvel tem para população.
Muitas vezes faltam espaços para
instalação dos arquivos históricos, públicos e/ou particulares, de museus,
memoriais, de salas de leitura e pesquisa, de comunicação via internet, de
salas para cursos, palestras, apresentações, de espaços para atividades
culturais, educacionais ou sociais, locais para informações turísticas, entre
tantas outras coisas. Por isso, quando existe a disposição de um imóvel que é
referência para a história de um lugar, é preciso avaliar coletivamente.
É preciso organizar um conselho
para os bens culturais, formá-lo com profissionais capacitados e atuantes em
diversas áreas do conhecimento. É preciso, mais que ouvir, porque às vezes, aos olhos e de alguns ou da
maioria, não faz sentido preservar um determinado espaço, por mais
significativo que seja para a história de um determinado lugar. É preciso
discutir, elencar os prós e os contra, buscar informações sobre os possíveis
usos, dar significância, buscar auxílio financeiro para a conservação junto aos
órgãos competentes e quando possível torná-los uma forma de investimento. O que
não se pode é ficar indiferente.
*Texto publicado pelo Jornal O Florense, 19.10.2012,
escrito pela professora de História, pesquisadora e escritora Gissely Lovatto Vailatti.
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